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Incêndios geram impactos dentro e fora do agro

Incêndios geram impactos dentro e fora do agro

*Por Ana Beatriz Prudente Alckmin

Em meio ao crescente desafio das queimadas, o Brasil está buscando apoio internacional para fortalecer suas ações de combate aos incêndios florestais. O Governo Federal acionou embaixadas em países como Paraguai, Colômbia, e Estados Unidos, solicitando recursos e colaboração para enfrentar a grave situação, que já resultou em mais de 190 mil focos de incêndio desde o início do ano. A ministra do Meio Ambiente, Marina Silva, destacou a necessidade de aeronaves e brigadistas para auxiliar nas operações, evidenciando a urgência de uma resposta coordenada diante da crise ambiental que se arrasta há vários meses.

Dez cidades das regiões Norte e Centro-Oeste do Brasil concentram 20,5% das queimadas registradas até setembro de 2024, com destaque para municípios da Amazônia. Especialistas alertam que os incêndios se tornaram um novo vetor de degradação ambiental, complicando ainda mais os esforços para monitorar e controlar a destruição das florestas e dos biomas. Este cenário exige uma abordagem integrada e urgente para mitigar os impactos ecológicos e sociais.

Muitos desses focos de incêndios estão ocorrendo em áreas de cultivo de cana-de-açúcar, especialmente no estado de São Paulo, e isso têm gerado grandes prejuízos econômicos e ambientais. De acordo com representantes da União da Indústria de Cana-de-Açúcar e Bioenergia (UNICA), o setor já acumula perdas que ultrapassam R$ 1 bilhão devido a queimadas que atingiram mais de 180 mil hectares. Embora a prática de queima da palha da cana como método de pré-colheita tenha sido proibida desde 2014, ainda persiste um equívoco comum de que as usinas continuam utilizando o fogo como parte do processo de colheita, o que não é verdade. Atualmente, quase toda essa operação é realizada de forma mecanizada, e o uso do fogo está banido pelos produtores de cana de açúcar.

A origem desses incêndios pode estar associada tanto a causas naturais, como a seca extrema e condições climáticas desfavoráveis (o fenômeno triplo-trinta: temperatura acima de 30°C, umidade relativa do ar abaixo de 30% e ventos superiores a 30 km/h), quanto a atos de negligência ou mesmo de crime. Bitucas de cigarro jogadas nas estradas ou fogo colocado de maneira intencional para queima de lixo, são algumas das causas relatadas. Além disso, o setor enfrenta o desafio das Fake News, que acusam injustamente as usinas e produtores rurais de provocarem intencionalmente as queimadas, criando uma imagem negativa e que prejudica o setor, tanto financeiramente, quanto em termos de reputação.

Diante desse cenário, o setor do cultivo de cana de açúcar tem se mobilizado de maneira intensa. A UNICA, em parceria com a Defesa Civil e outros órgãos, implementou medidas rigorosas de combate a essas queimadas, incluindo o uso de aviões e caminhões-pipa, além da mobilização de mais de 10 mil colaboradores treinados para lidar com incêndios. A atuação coordenada também envolve um Programa de Auxílio Mútuo (PAM), no qual várias usinas da mesma região colaboram entre si.

Com isso tudo, outras consequências poderão ser sentidas, além do ambiental. Há ainda a questão de mercado. Pois, a formação do preço de commodities como o açúcar e o etanol, impactados por esses incêndios, é influenciada por diversos fatores, como a oferta e a demanda globais, não sendo possível prever diretamente o impacto disso. No entanto, o prejuízo causado pelas queimadas é evidente, afetando não apenas o setor, mas também a qualidade do ar e a produção agrícola de modo geral. As usinas, que historicamente eram vistas como vilãs ambientais, agora desempenham um papel fundamental no combate ao fogo, contribuindo para evitar que a situação se torne ainda mais grave.

É evidente que são grandes os prejuízos. De um lado, por exemplo, muitos canavicultores do interior de São Paulo, amargam prejuízos milionários. Estima-se que os incêndios tenham afetado mais de 231 mil hectares, com 132 mil hectares ainda não colhidos, segundo a União da Indústria da Cana de Açúcar (Única). As regiões de Ribeirão Preto, São José do Rio Preto e São Carlos foram duramente atingidas, com mais de 3 mil focos de incêndio registrados. A combinação de seca severa piorou o cenário já crítico que os agricultores locais vinham enfrentando, especialmente aqueles que perderam grande parte da produção das plantações mais jovens.

A Organização de Associações de Produtores de Cana do Brasil reforça sobre as perdas, quando cita que os prejuízos somam cerca de R$ 1,2 bilhão. A recuperação dessas áreas será lenta, representando um enorme desafio para todo setor nos próximos anos. Com a destruição das lavouras, o impacto econômico para os produtores e para o mercado de açúcar e etanol é significativo, reforçando a necessidade de medidas mais eficazes para prevenir novas queimadas no futuro.

*Ana Beatriz Prudente Alckmin é educadora de Economia Criativa Rural e Agrossustentabilidade. Mentora de empreendedorismo sustentável com Design Thinking, pedagoga e pesquisadora da USP.

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De fornecedor à potência global, entenda como o agro brasileiro se tornou uma peça-chave para a economia mundial

Divulgação/ Freepik

CEO da Agrotools explica que os recursos naturais e a inovação tecnológica no setor tornaram o país um protagonista nas decisões mais relevantes da atualidade

Nas últimas décadas, o Brasil passou a ocupar um papel central no fornecimento de alimentos e recursos naturais para o mundo. O Ministério da Cultura ressalta um pouco dessa função ao revelar que o país exportou mais de US$ 164 bilhões em produtos do agronegócio em 2024. Só na categoria de carnes bovinas foram 2,89 milhões de toneladas comercializadas e quase US$ 13 bilhões movimentados, como divulgou a Associação Brasileira das Indústrias Exportadoras de Carnes (Abiec), com base em informações do governo.

De acordo com Sergio Rocha, fundador e CEO da Agrotools, maior ecossistema de soluções digitais para o agro, esses números ressaltam o “rearranjo significativo das forças econômicas globais” que vem acontecendo de alguns anos para cá. “Com o fim da Guerra Fria e a globalização, o planeta se tornou multipolar e economias emergentes como o Brasil se transportaram para a linha de frente de importantes decisões mundiais”, diz.

Esse papel também é evidenciado pelo aumento da demanda global por alimentos, que é um dos maiores desafios do século 21. Segundo a FAO, a produção alimentícia precisará aumentar 70% até 2050 para atender à população do mundo inteiro, estimada em 9 bilhões de pessoas. 

“Nossa extensão territorial, riqueza de recursos naturais e desenvolvimento acelerado de novas tecnologias para o agro reforçam que somos protagonistas na garantia da segurança alimentar”, ressalta o executivo. “Já passou o tempo em que éramos só um país de ‘terceiro mundo’. A nossa participação ativa no G20 e nos BRICS comprova que temos uma responsabilidade estratégica em assegurar uma maior eficiência produtiva, tanto internamente quanto para outras nações”, completa.

Avanço tecnológico
Um dos principais fatores que têm destacado o agronegócio no país para o resto do mundo é a evolução tecnológica. O segmento tem incorporado diversas soluções inovadoras, como biotecnologia, agricultura de precisão, inteligência artificial e blockchain, para aumentar a sua produtividade.

Para Rocha, se esses avanços continuarem sendo aplicados no contexto de privilégios naturais, o Brasil terá ainda mais força como potência global. “A inteligência de dados e processos no campo tem otimizado toda a cadeia produtiva de uma forma inédita. Isso nos torna mais competitivos e relevantes globalmente”, destaca.

Ainda vale reforçar que a tecnologia passou a ser uma grande aliada do agro pela sua capacidade de ajudar no enfrentamento de dificuldades que surgiram nos últimos anos, como as mudanças climáticas. O CEO exemplifica: “As ferramentas digitais são essenciais para solucionar problemas de safras de commodities, exacerbados pelo aquecimento global, como epidemias de pragas em plantações. No caso da produção de cacau, por exemplo, com chuvas intensas seguidas de altas temperaturas e períodos de seca, estão dizimando cacaueiros no Brasil, Costa do Marfim e Gana”, explica.

Produção sustentável
Outro foco de atenção para o agronegócio brasileiro é a sustentabilidade. A realização da COP30, em novembro no Brasil, e a liderança em iniciativas como rastreabilidade, agricultura regenerativa e mitigação de riscos climáticos mostram que o país possui uma posição extremamente relevante na caminhada para um setor alinhado ao ESG (sigla para “Ambiental, Social e Governança”).

O fundador da Agrotools pontua que a tecnologia também é essencial para solidificar essa função, colocando o Brasil como uma “potência agroambiental”. “Mesclar a inovação tecnológica às políticas de desenvolvimento sustentável pode garantir um crescimento equilibrado do agro, fortalecendo a nossa influência na economia global”, conclui o executivo.

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Inspirar pelo exemplo: a importância de abrir caminho para mais mulheres na ciência

Viviane Silva é CSO da InEdita Bio

*Por Viviane Silva

Existem muitos caminhos que uma pessoa pode escolher em sua vida. Um dos que mais me emociona é aquele trilhado pelo exemplo. O meu veio da infância. Minha paixão pela ciência e biotecnologia começou com o entusiasmo das minhas professoras dessas matérias, que sempre estimulavam seus alunos com perguntas instigantes. Os eventos de feiras de ciências eram desafios fascinantes, que despertavam o desejo de pesquisar e compreender os processos que regem a vida, exigindo dedicação e criatividade ainda na jornada escolar. Cresci ouvindo sobre grandes projetos dos anos 90, como o Genoma Humano e a clonagem da ovelha Dolly – dois marcos científicos que abriram inúmeras portas para a ciência moderna. 

As novas gerações também contam com boas fontes de inspiração. Em 2023, quatro dos onze laureados com o Prêmio Nobel eram mulheres (esse mesmo número também aconteceu em 2008 e 2020). Em 2023, a bioquímica Katalin Karikó se tornou a 13ª mulher na história a ganhar um Nobel em Medicina. O número de mulheres cientistas laureadas ainda é baixo, mas seus estudos têm um impacto gigantesco, como por exemplo as descobertas de Karikó que possibilitaram o desenvolvimento de vacinas de RNA eficazes contra a COVID-19.

Gosto de usar o exemplo de Karikó porque sua trajetória foi longa e imprevisível. Iniciou sua carreira científica na Hungria, migrou para os Estados Unidos no fim dos anos 80 e, além dos incansáveis experimentos, enfrentou inúmeras dificuldades para obter financiamento e a aceitação de suas pesquisas. Hoje, além de laureada, é professora na Hungria e nos Estados Unidos e ocupa um cargo de liderança na empresa de biotecnologia alemã BioNTech.

Sua história é inspiradora porque reforça a importância de não perder a confiança no que buscamos. Um projeto de pesquisa iniciado por uma jovem cientista pode levar a uma descoberta transformadora – e, no caso de Karikó, salvou milhões de vidas.

Por isso, encorajar a participação feminina em áreas de inovação e tecnologia é fundamental tanto quantitativa quanto qualitativamente. Com mais mulheres nesses setores, ampliam-se as perspectivas e surgem novas formas de construir soluções. A baixa presença feminina na ciência reduz nossa capacidade de avançar. Em termos de qualidade, a diversidade é um fator essencial para o progresso do conhecimento.

Mas ainda há um longo caminho a ser percorrido. Dados da Organização Mundial da Propriedade Intelectual mostram que a equidade de gênero nos pedidos de patentes internacionais está crescendo, mas em um ritmo bastante lento. Se mantivermos esse compasso, a paridade só seria atingida em 2061. As mulheres continuam minoria em diversas carreiras, como engenharia e ciências da computação – justamente áreas que concentram grande parte dos inventores e profissionais responsáveis por inovações.

No entanto, há uma boa notícia. Pelo menos na América Latina, na área de ciências da vida, há um forte engajamento de mulheres nas atividades de patenteamento. Além disso, iniciativas no Brasil e no mundo, lideradas por mulheres, vêm reforçando a presença feminina no empreendedorismo inovador e na proteção da propriedade intelectual. Isso é promissor, pois permite que as novas gerações de meninas se vejam representadas e considerem a ciência como uma opção de carreira.

Nós, cientistas brasileiras, somos reconhecidas internacionalmente, lideramos empresas de biotecnologia e fazemos descobertas relevantes. Somos pesquisadoras, professoras universitárias, empreendedoras e mães, tudo ao mesmo tempo. O que precisamos é de mais incentivo e oportunidades.

*Viviane Silva é CSO da InEdita Bio

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Mercado de carbono no Brasil: Uma nova era para o agronegócio

Mercado de carbono no Brasil: Uma nova era para o agronegócio

*Por Ivan Pinheiro, criador do aplicativo Carbono Neutro e diretor da RDG Ecofinance

A recente aprovação da Lei de nº 15.042/2024, que regulamenta o mercado de carbono no Brasil, representa um marco significativo para a sustentabilidade no país. Com a criação do Sistema Brasileiro de Comércio de Emissões de Gases de Efeito Estufa (SBCE), o Brasil se posiciona como protagonista no cenário global de combate às mudanças climáticas, promovendo um ambiente propício para a inovação e a geração de novas fontes de receita.

Um dos pilares dessa nova legislação é a Lei do Pagamento por Serviços Ambientais (PSA), sancionada em 2021, que permite aos proprietários rurais serem remunerados por manter áreas de preservação em suas propriedades. O Código Florestal Brasileiro já estabelece que os produtores rurais devem manter uma porcentagem de suas terras como áreas de preservação permanente e reservas legais, variando de 20% a 80% da propriedade, dependendo da região. Com a implementação da PSA, essas áreas, antes vistas apenas como passivos ambientais, podem se transformar em ativos financeiros por meio da comercialização de créditos de carbono.

Com essas duas legislações – SBCE e PSA -, o Brasil estabelece um mercado regulado onde as emissões de gases de efeito estufa (GEE) podem ser monitoradas e comercializadas. Isso significa que, produtores rurais que mantêm suas reservas legais e geram créditos de carbono, podem vender esses créditos a empresas que buscam compensar suas emissões. Segundo dados do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), 61% das propriedades rurais no Brasil possuem áreas destinadas à preservação, o que representa um potencial significativo para a geração de créditos de carbono.

A monetização das reservas legais e áreas de preservação permanente não apenas recompensa os produtores por seus esforços de conservação, mas também incentiva a adoção de práticas agrícolas mais sustentáveis. Isso contribui para a redução das emissões de gases de efeito estufa e fortalece a imagem do agronegócio brasileiro como líder em sustentabilidade. A Confederação da Agricultura e Pecuária do Brasil (CNA) estima que o mercado de carbono tem o potencial de gerar R$ 50 bilhões de receita adicional para os produtores até 2030.

Além disso, há empresas especializadas imprescindíveis nesse processo, auxiliando os produtores na quantificação do estoque de carbono em suas propriedades, na certificação desses créditos e na intermediação da venda no mercado. São plataformas desenvolvidas para oferecer suporte na implementação de estratégias que promovem a sustentabilidade nas fazendas, como a recuperação de áreas degradadas, o plantio de florestas comerciais e a adoção de sistemas de integração lavoura-pecuária-floresta (ILPF).

A regulamentação do mercado de carbono no Brasil é uma resposta às exigências globais por ações climáticas e uma oportunidade para o agronegócio brasileiro. Com a implementação da SBCE e o fortalecimento da lei do PSA, o país tem a chance de liderar um movimento em direção à sustentabilidade econômica e ambiental.

A combinação das reservas legais com a possibilidade de comercialização dos créditos de carbono cria um ciclo onde todos ganham: o meio ambiente é protegido, os agricultores são recompensados por suas práticas sustentáveis e o Brasil se posiciona como um líder em soluções climáticas inovadoras. O futuro do agronegócio brasileiro está intrinsecamente ligado à sua capacidade de se adaptar e prosperar dentro desse novo paradigma econômico sustentável.

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