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Quebras de safra intensificam o interesse público pela irrigação

O Paraná, por exemplo, liderado pelo Governador Ratinho Junior, a cada ano busca aumentar o seu protagonismo no cenário do agronegócio nacional.

Paraná, São Paulo e Mato Grosso buscam planos de ação para ampliarem suas áreas irrigadas e assim tentar minimizar os impactos climáticos nas lavouras

Para o desenvolvimento de qualquer cultura é fundamental o conjunto básico: água, solo e clima. O grande problema é que quando há o desequilíbrio de qualquer um desses três elementos na natureza, seja por excesso ou escassez, a agricultura fica inviável, acarretando baixa produtividade nos cultivos e até mesmo em casos mais extremos, quebra de safra. O fato é que nos últimos anos esse descompasso está mais acentuado e a instabilidade climática mostra que mais do que nunca é preciso dar atenção ao tema, principalmente no que diz respeito a gestão dos recursos hídricos.

Nesse sentido, três estados brasileiros já despertaram para a importância do tema. Representantes dos governos do Paraná, São Paulo e mais recentemente de Mato Grosso, colocaram entre as prioridades em suas agendas soluções para reduzir os impactos do clima em suas lavouras. Entre as ferramentas escolhidas por todos eles, destacam-se as tecnologias de irrigação.

O Paraná, por exemplo, liderado pelo Governador Ratinho Junior, a cada ano busca aumentar o seu protagonismo no cenário do agronegócio nacional. Além da produção de soja e milho, o estado é referência no cultivo de cevada, feijão, mandioca, erva-mate, triticale e centeio. No entanto, apesar de seu vasto potencial, com quase 15 milhões de hectares de terras agrícolas, menos de 2% da área agricultável é atualmente irrigada.

Em São Paulo, as fortes estiagens nos últimos anos têm castigado a classe produtora, acarretando prejuízos bilionários a toda a cadeia. Para tentar minimizar esses impactos e ampliar a área irrigada, o Governo do Estado, representado pelo Secretário de Agricultura e Abastecimento, Guilherme Piai, tem se movimentado para desenvolver um plano de irrigação. O projeto é ambicioso e tem a meta de aumentar em mais de 2 milhões de hectares de terras agrícolas irrigadas. Atualmente a irrigação cobre apenas 6% da área de plantio e, para 2030, a meta é atingir 15%.

Já o Governador de Mato Grosso Mauro Mendes, estado que detém o título de maior potencial de crescimento na agricultura irrigada do Brasil, enfatizou a importância de desenvolver práticas sustentáveis que abordem os aspectos econômicos, sociais e ambientais. Atualmente, apenas 178 mil hectares por lá são irrigados, em comparação com os 8,2 milhões de hectares em todo o país. No entanto, um estudo recente revelou que MT poderia expandir sua área irrigada para até 3,9 milhões de hectares, representando um salto significativo no desenvolvimento.

De acordo com Eduardo Navarro, Presidente da Câmara Setorial de Equipamentos para Irrigação (CSEI) e vice-presidente na Lindsay Corporation, com esse interesse por parte das autoridades dos três importantes estados, todos nessa cadeia só têm a ganhar. “A busca por mais informações pela irrigação cresceu principalmente pelas quebras de produtividade que estão ocorrendo. A utilização de pivôs é uma excelente saída para que tenham a proteção da sua produtividade, como se fosse, de fato, um seguro”, disse.

“Nós da CSEI e também a Rede Nacional da Agricultura Irrigada (Renai) temos nos dedicado para ajudar nesse sentido”, complementou.

Apoio da indústria

Além da CSEI do Renai, as empresas do setor também se empenham nessa jornada. Uma delas é a Lindsay, que tem apoiado os governos a desenvolver políticas, planos de ações, para que as regiões tenham, de fato, um incremento de agricultura irrigada mais rápido.  “Com as reuniões e visitas até em nossa sede em Nebraska, nos Estados Unidos, região que é pioneira em irrigação, nosso objetivo é ajudar a desburocratizar a atividade, auxiliando na solução dos gargalos”, destacou Navarro.

Entre as barreiras que limitam a expansão dessa tecnologia, principalmente por pivôs, está, por exemplo, a disponibilidade de energia elétrica, algo que os governos têm o papel fundamental atuando juntamente com as companhias de energia elétrica. “Esse empenho conjunto, ajudará a melhorar a infraestrutura, para que de fato os produtores consigam implementar e utilizar os equipamentos”, pontuou o executivo.

Outro assunto relevante nessa pauta são as outorgas e licenças ambientais, que muitas vezes demoram muito tempo para liberação. “Desburocratização da irrigação e suas outorgas, é um tema importante. Esse processo precisa ser sim muito sério e criterioso, mas ao mesmo tempo, é necessário ser mais ágil e claro para os produtores”, reforçou Navarro.

Conversas continuam

De acordo vice-presidente da Lindsay, os primeiros passos desta importante jornada foram dados e as conversas alinhadas com as indústrias com os representantes dos estados nesses encontros continuam. “Nós como indústria estamos fazendo o nosso papel, doamos equipamentos para escolas técnicas do Paraná e São Paulo com o objetivo de formar profissionais especializados em irrigação para suportar o crescimento dos próximos anos. Além disso, seguimos à disposição para ajudar nessa espécie de mentoria e assim fomentar cada vez mais esse importante tema”, disse.

O presidente da CSEI reforçou ainda a importância de ampliar esse tema para demais regiões. Segundo ele, quebras de safras geram um impacto muito grande ao produtor e também para a economia local e nacional, por isso é preciso buscar alternativas. “Começamos esse movimento e quanto maior for a quantidade de governadores com o tema irrigação em suas agendas, melhor será, ampliando isso para o âmbito federal. Assim como já ocorre nos EUA, essa aproximação público-privada, ajudará também o Brasil a reduzir os efeitos climáticos e a irrigação é fundamental nisso, aumentando a produtividade de forma sustentável”, finaliza o executivo.

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Produção de etanol de milho cresce, mas disputa por biomassa ameaça ritmo das usinas 

Imagem: Freepik

Mercado aquece e expõe gargalos energéticos que podem definir a competitividade de novos projetos da próxima safra 

Com a produção brasileira de etanol de milho projetada para alcançar 10 bilhões de litros até o final de 2025, segundo dados da Unem, o setor entra em uma fase de expansão que vem reconfigurando o mapa industrial do país. O avanço, porém, expõe um desafio que até pouco tempo era secundário e agora se torna decisivo para a competitividade das plantas: garantir energia térmica confiável, barata e sustentável para assegurar a operação crescente das usinas.

A demanda por biomassa já dá sinais de pressão em polos importantes do Centro-Oeste, onde projetos de etanol, fertilizantes, processamento de grãos e indústrias madeireiras passaram a disputar o mesmo insumo. Em algumas regiões, agentes do setor já falam abertamente sobre o risco de “estreitamento de oferta”, fenômeno equivalente a um possível apagão de biomassa em períodos de alta demanda.

Um ponto sensível nesse contexto é a energia térmica, já que o vapor é o responsável por sustentar etapas críticas do processo industrial e responde por grande parte do custo operacional. Sem previsibilidade de preço e de suprimento, qualquer oscilação impacta diretamente margens e produtividade.

A alternativa que começa a ganhar tração no setor é a adoção de soluções térmicas flexíveis, capazes de operar com múltiplas biomassas ao longo do ano, reduzindo o risco de escassez e garantindo a continuidade da operação. Em alguns projetos industriais, já existem caldeiras aptas a trabalhar com até 14 tipos diferentes de biomassa, incluindo cavaco de madeira, bagaço de culturas regionais e resíduos agrícolas.

Nesse cenário, empresas especializadas na gestão de energia térmica passam a ocupar um espaço relevante. A ComBio, por exemplo, opera unidades dedicadas dentro de diferentes plantas industriais, assumindo integralmente a responsabilidade por suprimento, operação e desempenho das caldeiras. O modelo surgiu como alternativa para mitigar a volatilidade no mercado de biomassa e dar previsibilidade a setores que dependem de grandes volumes de vapor. Na prática, a empresa funciona como uma gestora térmica de longo prazo, capaz de adaptar a matriz de combustível conforme a disponibilidade regional e reduzir o impacto das oscilações do mercado.

Segundo Ricardo Blandy, diretor comercial da ComBio, essa flexibilidade deixa de ser um diferencial e passa a ser condição básica de segurança energética: “Para o produtor de etanol de milho, a atenção ao suprimento de biomassa é vital, pois a usina simplesmente não funciona sem ela. Em várias regiões do país, já há um risco concreto de escassez desse insumo. Por isso, adotar caldeiras que operem com diferentes tipos de biomassa deixou de ser opção e se tornou uma exigência para garantir segurança e continuidade operacional”.

O consumo elevado do setor também exige novas formas de organizar a cadeia. Uma única usina pode demandar 300 mil a 400 mil toneladas de biomassa por ano, volume que pressionará ainda mais o mercado conforme novos projetos entrem em operação. Para garantir estabilidade, especialistas defendem o uso de contratos de longo prazo, rastreabilidade da origem da biomassa e desenvolvimento de novas cadeias regionais.

A discussão energética também se conecta à pauta climática. Em 2024, soluções térmicas baseadas em biomassa evitaram a emissão de centenas de milhares de toneladas de CO₂ no país, reforçando a narrativa de sustentabilidade que acompanha a expansão do etanol de milho.

Para Blandy, o setor vive um momento de tomada de decisão estratégica. “Vale a pena pensar em flexibilidade e em desenvolver novas biomassas. A região que hoje não tem oferta pode ter daqui a cinco ou dez anos. E o projeto térmico precisa estar preparado para isso”, afirma.

Com novos projetos prestes a sair do papel e a competição global por biocombustíveis de baixo carbono aumentando, a forma como o setor lidará com sua matriz térmica pode definir não apenas o ritmo de expansão, mas quem conseguirá manter competitividade em um mercado cada vez mais exigente.

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Modelo de pele humana amplia alternativas aos testes de cosméticos em animais

Imagem: divulgação

Parceria com empresa de dermocosméticos permitiu que laboratório da UFPR produzisse modelo de tecidos por bioimpressora 3D, equipamento que constrói estruturas biológicas tridimensionais. O projeto reforça caminho para adaptação da indústria à nova legislação e para mais precisão científica na avaliação de cosméticos

Em julho de 2025, foi sancionada a Lei 15.183, que proíbe a realização de testes de cosméticos, perfumes e produtos de higiene pessoal em animais. A regulamentação reflete uma mudança de consciência na sociedade, cada vez mais atenta à necessidade de eliminar práticas consideradas cruéis. 

Diante da proibição da conduta e contando com o avanço tecnológico e científico que hoje já apresenta alternativas a essa prática, empresas de cosméticos passaram a desenvolver ou financiar a criação da chamada pele humana equivalente, um modelo de pele artificial construído em laboratório que imita características da pele humana real e pode desempenhar, entre outras aplicações, papel fundamental em testes de segurança e eficácia de cosméticos. 

Atendendo a essa demanda, uma parceria tripartite envolvendo a Universidade Federal do Paraná (UFPR), a Fundação da Universidade Federal do Paraná (Funpar) e a empresa brasileira de dermocosméticos Creamy Skincare está desenvolvendo seu próprio modelo de pele humana equivalente como método alternativo ao ensaio de permeação cutânea para a avaliação de produtos cosméticos. 

O projeto é conduzido em Curitiba no Laboratório de Bioensaios de Segurança e Eficácia de Produtos Cosméticos (Labsec), do Departamento de Farmácia, sob a coordenação da professora Daniela Maluf. A iniciativa conta ainda com o apoio do Hospital Nossa Senhora das Graças, responsável por fornecer pele humana descartada em cirurgias. Esse material permite o cultivo e a multiplicação de células que, posteriormente, são aplicadas em uma matriz gel com auxílio de uma bioimpressora 3D. 

Maluf explica que a impressão tridimensional exige o desenvolvimento de uma biotinta, mistura de células vivas e biomateriais compatíveis, como hidrogéis, para dar suporte à vida celular.

“Cultivamos as células obtidas da pele descartada em cirurgias plásticas para que se multipliquem ao ponto de podermos congelá-las. Quando necessário, descongelamos essas células e utilizamos a bioimpressora 3D para reconstruí-las em camadas tal como as da pele humana”. 

A pesquisadora destaca que essa biotinta tem uma composição única. Cada grupo de pesquisa que trabalha na área produz a sua formulação. “A biotinta reúne componentes como colágeno, ácido hialurônico, fatores de crescimento e outros elementos que dão suporte para que as células se proliferem nessa matriz gel”. 

Hoje, diversas empresas do setor cosmético já pesquisam e produzem seus próprios modelos de pele humana equivalente, alguns deles disponíveis comercialmente. 

Esses modelos, porém, apresentam limitações, como dificuldades de viabilidade celular, que é a capacidade das células permanecerem vivas e funcionais, afetada por condições de transporte e importação. Para atender às necessidades específicas de seus produtos, a Creamy decidiu investir no desenvolvimento de um modelo próprio por meio da parceria com a UFPR.  

No projeto, o parâmetro selecionado é o de permeação, isto é, a capacidade de um produto atravessar as camadas da pele. “Optamos por esse parâmetro porque, para outros tipos de ensaio, já existem estudos validados e reconhecidos pela Rede Nacional de Métodos Alternativos ao Uso de Animais [Renama]. Para permeação, ainda não há um modelo oficial”, explica Daniela. 

Percurso técnico envolve coleta de pele humana que seria descartada

Após a aprovação da pesquisa pelos comitês de ética e o cumprimento das etapas burocráticas, o primeiro passo para o desenvolvimento do material é a coleta de pele humana. O projeto tem a parceria do urologista Rodrigo Krebs, do Hospital Nossa Senhora das Graças, de Curitiba, que fornece amostras normalmente descartadas em cirurgias de postectomia, sempre mediante autorização dos pacientes. 

Para manter a viabilidade do tecido, a equipe do Labsec envia meios de cultura e transporte adequados ao hospital. Com o material em mãos, os pesquisadores iniciam a etapa de dissociação celular. “Primeiro, realizamos uma fragmentação mecânica com bisturi; em seguida, aplicamos tratamentos enzimáticos e centrifugações para separar queratinócitos, fibroblastos e outras células. Depois disso, elas são transferidas para meios de cultivo específicos, onde podem se proliferar”, relata Daniela. 

Quando atingem a quantidade necessária, as células se tornam aptas para aplicação na matriz gel e para a reconstrução em camadas pela bioimpressora 3D. Esse processo, no entanto, só foi possível após extensa pesquisa preliminar. 

Segundo a professora, mais de 100 formulações de biotinta foram testadas até que se chegasse à viscosidade, resistência e performance compatíveis com a pele humana. “Foram muitos experimentos até encontrarmos o ponto ideal. Agora, nosso maior desafio é manter a viabilidade das células dentro na biotinta”, afirma. 

Krebs, que também é professor de Urologia na UFPR, destaca que o uso de um tecido humano normalmente descartado em cirurgias amplia horizontes para a pesquisa. “Isso abre novas possibilidades para reduzir a experimentação animal em produtos destinados a humanos. Não há avanço sem parcerias. A multidisciplinaridade é, sem dúvida, a chave para o progresso”, diz. 

Atual etapa visa verificar a viabilidade do modelo

A Creamy, financiadora do projeto, espera desenvolver um modelo de pele artificial altamente confiável, que permita testar ativos e formulações de forma ética e com precisão científica.  “Além de substituir testes em animais, esse avanço deve acelerar o desenvolvimento de produtos, ampliar a capacidade de inovação e trazer ainda mais segurança para o consumidor. É também uma oportunidade de fortalecer a pesquisa nacional e abrir caminho para cosméticos mais sustentáveis e tecnologicamente avançados”, diz Luiz Romancini, médico dermatologista e cofundador da Creamy. 

A etapa atual consiste na validação da robustez desse modelo. “Obtivemos bons resultados no desenvolvimento e na microscopia, comprovando a viabilidade das células no protótipo. Agora estamos avaliando a viabilidade celular por períodos mais longos e, na sequência, aplicaremos cosméticos para comparar o desempenho do modelo com o da pele humana”, diz a pesquisadora. 

A previsão é que o modelo esteja pronto para uso em maio de 2026. Após sua conclusão, caberá à empresa decidir se o disponibilizará à Renama e ao Conselho Nacional de Segurança Alimentar e Nutricional (Consea) para viabilizar sua comercialização. 

Oportunidade de integração entre universidade e indústria 

No modelo tripartite adotado, cabe à marca de dermocosméticos financiar a pesquisa, enquanto a professora e suas alunas conduzem a parte científica, e a Funpar fica responsável pela gestão dos recursos. 

Desde 2023, quando a parceria começou, a Creamy tem adquirido insumos, equipamentos, oferecido bolsas de pesquisa e assegurado todos os recursos financeiros necessários. A exclusividade sobre o produto permanece com a empresa. 

Para o cofundador da empresa, Luiz Romancini, a UFPR é uma das instituições mais avançadas do país em pesquisa de biotecnologia e modelos de pele. “Existe um histórico sólido de estudos nessa área, com uma equipe altamente qualificada e infraestrutura de ponta. Para nós, faz sentido unir forças com uma universidade que alia rigor científico, experiência e capacidade real de transformar pesquisa em inovação aplicada ao setor cosmético”, avalia. 

Pele humana equivalente traz novos horizontes para a biotecnologia 

Luiz Romancini entende que investir em pesquisa acadêmica é fundamental para elevar o nível da indústria cosmética brasileira. “É nesse ambiente que surgem novas tecnologias, metodologias mais éticas e soluções que permitem criar produtos mais seguros e eficazes. Quando aproximamos a ciência da realidade do mercado, conseguimos acelerar avanços, fortalecer a inovação nacional e criar alternativas que acompanham o que há de mais moderno no mundo”. 

Além de possibilitar testes de cosméticos sem o uso de animais, modelos de pele humana equivalente podem ser aplicados na cicatrização de feridas complexas em pacientes queimados, em testes clínicos e em outras análises relacionadas à fisiologia da pele. 

Pesquisas correlatas investigam ainda o uso da bioimpressão 3D para a produção de outros órgãos, abrindo possibilidades futuras até mesmo para transplantes. Para que esses avanços se concretizem, o investimento contínuo e a valorização das pesquisas de ponta desenvolvidas nas universidades são fundamentais. 

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Nova edição do Observatório da Restauração é lançada com mais de 200 mil hectares mapeados

Imagem: Freepik

Área em recuperação nos ecossistemas é 158% maior do que a identificada em 2021, ano em que a plataforma, mantida pela Coalizão Brasil, foi inaugurada

Com 204,2 mil hectares em processo de restauração, uma área equivalente a 285 mil campos de futebol, o Brasil tem registrado um crescimento expressivo em área recuperada em seus seis biomas — principalmente na Mata Atlântica e na Amazônia. Trata-se de um aumento de 158% em relação a 2021, quando foram mapeados 79 mil hectares, e de 33% ante o ano passado. Os números são do Observatório da Restauração (OR), uma das principais plataformas de dados do país dedicada a esta atividade. Mantida pela Coalizão Brasil Clima, Florestas e Agricultura, o observatório acabou de ser lançado em um evento online que está disponível no canal da Coalizão no Youtube.

A restauração da vegetação nativa é fundamental para a manutenção do fornecimento de sistemas ecossistêmicos essenciais para a saúde, a produção agrícola, a segurança hídrica, a igualdade social e o desenvolvimento sustentável. Em sua contribuição ao Acordo de Paris, o Brasil comprometeu-se a restaurar 12 milhões de hectares até 2030 — a meta foi reforçada pelo governo federal em 2024, no Plano Nacional de Recuperação da Vegetação Nativa (Planaveg). Estima-se que a atividade pode gerar mais de 2,5 milhões de empregos diretos.
 
O OR tornou-se pioneiro na articulação com coletivos atuantes nos seis biomas brasileiros, que reportam dados com base em uma metodologia única, desenvolvida pela gestão da plataforma.  

“O Observatório é uma ferramenta essencial não somente pela contabilização de hectares em si, mas pela articulação e visibilidade aos atores que fazem a restauração acontecer”, explica Tainah Godoy, secretária-executiva do OR. Dessa forma, a plataforma consegue integrar dados de qualidade que trazem a realidade do campo para os tomadores de decisão, como o poder público e investidores. 

O processo de coleta e validação dos dados tem, portanto, uma análise diferente da feita por outras instâncias, como o Ministério do Meio Ambiente e Mudança do Clima (MMA) — que, em um evento na COP 30, anunciou que o país conta com 3,4 milhões de hectares em restauração.  

Os indicadores do MMA consideram diferentes dinâmicas de recomposição do território, incluindo extensas áreas de vegetação secundária em regeneração natural — ou seja, florestas que avançam de forma natural e espontânea. Já o OR trabalha com um recorte metodológico específico, baseado em informações autodeclaratórias de empresas e organizações que desenvolvem ações de restauração com algum nível de manejo ou intervenção planejada.  

A restauração por biomas

Segundo o OR, os biomas mais beneficiados com projetos de restauração são a Mata Atlântica (com 131,2 mil hectares mapeados, o equivalente a 64% da área total monitorada) e a Amazônia (39,7 mil hectares, ou 19%).  

No Cerrado, foram identificados 31,7 mil hectares em restauração (15% do território mapeado). Na Caatinga foram compilados mil hectares (0,06%), enquanto o Pantanal soma 280 hectares (0,01%) e o Pampa, 260 hectares (0,01%). 

“A Mata Atlântica, Amazônia e Cerrado possuem redes multissetoriais pela restauração, consolidadas há anos, que impulsionam a recuperação de seus biomas. Isso contribui para o engajamento da sociedade, o desenvolvimento de pesquisas e a formação de mão de obra qualificada para a atividade”, ressalta Godoy. “Já os coletivos da Caatinga, o Pampa e o Pantanal iniciaram recentemente suas operações, e a estruturação de redes leva tempo.” 

Mata Atlântica: Desafio de reconectar fragmentos florestais

Ao mesmo tempo em que a Mata Atlântica apresenta os principais esforços de restauração, o bioma é também o mais degradado do país. De acordo com Rubens Benini, diretor de Florestas e Restauração da The Nature Conservancy (TNC) Brasil e coordenador do Pacto pela Restauração da Mata Atlântica, restam menos de 24% da área original e, desse restante, metade está em processo de degradação.  

“A Mata Atlântica vive um cenário delicado que requer muita atenção”, alerta Benini. “A pressão da expansão urbana e da agricultura tem acelerado o desmatamento. Para reverter esse quadro, iniciativas de restauração têm buscado recuperar áreas degradadas e reconectar fragmentos florestais. Mais de 2 milhões de hectares dessas áreas, por exemplo, estão em Áreas de Preservação Permanente (APP) e Reservas Legais, o que representa não apenas um desafio, mas também uma oportunidade de garantir a manutenção de serviços ecossistêmicos, como a conservação de nascentes e rios que abastecem grandes centros urbanos.” 

Cerrado: Restauração é arma contra a crise hídrica

O Cerrado também tem enfrentado uma crise de degradação, sendo a restauração ecológica uma das estratégias mais eficazes para garantir a segurança hídrica da população local, a mitigação da crise climática e a manutenção dos modos de vida dos povos e comunidades tradicionais. 

“O Cerrado enfrenta intensa pressão na mudança do uso do solo, resultando em perda significativa de biodiversidade”, explica Carol Sacramento, secretária executiva da Articulação pela Restauração do Cerrado (Araticum). “Nossos esforços buscam não apenas recuperar a vegetação nativa, mas também fortalecê-la. Queremos promover um olhar sobre o Cerrado que valorize as iniciativas de base comunitária e a diversidade de arranjos produtivos.”

Amazônia: ‘Arco pela restauração’ contra desmatamento

A Amazônia teve um avanço considerável de reporte de áreas em processo de restauração em relação aos dados de 2021, passando de 14,5 mil para 40 mil hectares, um aumento de 173% em quatro anos. 

“Esse aumento pode ser atribuído a diversos fatores, destacando o papel de  políticas públicas e iniciativas privadas”, explica Tainah Godoy, secretária-executiva do OR. “Vemos, nos últimos anos, o aumento da oferta por editais voltados à restauração de ecossistemas, além de ações envolvendo organizações da sociedade civil e empresas. Houve ainda, no ano passado, o lançamento pelo governo federal da iniciativa Arco pela Restauração, que visa recuperar a região do Acordo do Desmatamento, onde ocorrem 75% da devastação da floresta.” 

Caatinga: Aposta em restauração contra avanço da desertificação

Na Caatinga, um dos principais desafios é demonstrar que o bioma abriga uma imensa biodiversidade, o que reforça a necessidade de ampliar os investimentos em restauração. 

“Há um potencial imenso para a restauração que pode contribuir para reagirmos ao avanço da desertificação, que hoje já atinge 18% do território nacional, inclusive áreas do Pantanal e do Cerrado”, explica Pedro Sena, conselheiro executivo da Rede para Restauração da Caatinga (ReCaa). “Em nosso bioma, a restauração é biocultural: as pessoas conseguem se enxergar nas espécies com que vivem e trabalham.” 

Pantanal: Incêndios impulsionaram urgência pela restauração

O Pantanal foi o último bioma do país a ter um movimento expressivo pela restauração — justamente pelo fato de que, até a última década, era o que contava com os melhores índices de conservação de sua vegetação. Este cenário começou a mudar com as queimadas de 2020, que acometeram um terço do bioma. Em 2024, segundo pior ano da série histórica, o Pantanal registrou 14 mil focos de incêndio. 

“A diminuição de aproximadamente 60% da superfície de água do Pantanal, um bioma que depende das águas do planalto da Bacia do Alto Paraguai, é um fato alarmante”, ressalta Solange Ikeda, coordenadora do Pacto pela Restauração do Pantanal. “Portanto, as iniciativas de restauração são soluções eficazes para recompor áreas degradadas, recuperar a vegetação nativa e restabelecer os ciclos de inundação que sustentam a biodiversidade e garantem a proteção das nascentes desse ecossistema.”  

Pampa: Integração de restauração e manejo de pastos

No Pampa, a restauração segue uma lógica distinta da dos demais biomas, já que está voltada à integração com a produção animal. Isso porque sua vegetação nativa é predominantemente campestre, composta por uma grande diversidade de capins e gramíneas. “O pastoreio tem um papel importante na manutenção e equilíbrio desse ecossistema. Aliado aos esforços de pesquisas e iniciativas de restauração no bioma, que é mais recente, tem sido fundamental para garantir o bom uso do solo na região no longo prazo”, explica Godoy. 

Nova versão do Observatório

Lançado em 2021, o OR é uma plataforma independente e multissetorial dedicada ao mapeamento de áreas em restauração. Seu comitê gestor é formado por Coalizão Brasil, WWF, WRI Brasil, Imazon e The Nature Conservancy. 

Em sua terceira edição, o Observatório da Restauração anuncia a retirada do termo “Reflorestamento” de sua nomenclatura, reforçando seu compromisso exclusivo com a recuperação da vegetação nativa e da biodiversidade. A decisão reflete o amadurecimento técnico e normativo da agenda ambiental, que diferencia claramente a restauração ecológica — voltada à integridade dos ecossistemas — de práticas de reflorestamento associadas a plantios comerciais e espécies exóticas. Com essa atualização, o Observatório garante maior clareza conceitual e alinhamento com compromissos nacionais e internacionais, como o Planaveg e o Marco Global da Biodiversidade de Kunming‑Montreal. 

Nos últimos quatro anos, o grupo gestor do OR dedicou-se à qualificação dos dados, à coleta de novas informações, atualizações em seus processos de monitoramento e ao estabelecimento de parcerias com grupos atuantes no setor de restauração nos seis biomas brasileiros, conhecidos como coletivos biomáticos. São eles: Pacto pela Restauração da Mata Atlântica, Rede pela Restauração da Caatinga, Pacto pela Restauração do Pantanal, Articulação pela Restauração do Cerrado (Araticum), Aliança pela Restauração da Amazônia e Rede Sul — esta última, com atuação no Pampa. 

Os dados do OR estão disponíveis em: observatoriodarestauracao.org.br.

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